Jogos digitais e inteligência emocional, o que tem a ver?

Não é de hoje que as discussões sobre os malefícios causados nas crianças e adolescentes pelas mídias, tecnologias e jogos digitais estão acirradas entre educadores, profissionais da saúde, pesquisadores e os amantes das novidades tecnológicas. E de forma alguma tenho a intenção de tomar partido nesta disputa.

Meu objetivo é trazer elementos para refletirmos sobre a complexidade da conversa e elencar um ponto que para mim é significativo no desenvolvimento dos nossos estudantes: a Inteligência Emocional.

Antes, que tal retomar alguns fatores que influenciaram e influenciam até hoje na aceitação do novo quando falamos em educação?

Educar uma criança ou adolescente não é fácil, para afirmar isso nem precisa ser uma pedagoga, não é mesmo? Quando o processo educacional que estamos produzindo é atravessado por interferências externas temos a tendência de recuar, surge o medo. A primeira reação costuma ser excluir o perigo.

Foi assim com o surgimento da primeira televisão, das mídias e daí por diante. Tudo que era guardado, escondido das crianças ficou exposto; agora a sexualidade, a violência, as dores, o mundo está aberto para infância e a família precisa ou deveria dialogar sobre estes assuntos antes proibidos. A infância contemporânea desestruturou e abalou toda uma sociedade que fora baseada no silencio!

Sim! Acredito que todos nós concordamos que há limites plausíveis entre o aceitável para cada idade, e também entendo que a nostalgia de uma infância que já não existe somada a alfabetização midiática negada aos adultos contribui para tudo que foi posto até aqui.

Dito isto, volto ao assunto inicial deste artigo: a Inteligência Emocional frente aos malefícios ou benefícios dos jogos digitais, incluindo a pandemia mundial pela COVID19, que obrigou mais horas em casa e consequente exposição às telas.

Entendo, e encontro consonância na pesquisa de diferentes profissionais, que esta exposição traz muitos perigos, que vão desde o estresse mental e visual até o vício que faz com que adolescentes deixem inclusive de realizar necessidades fisiológicas. Destaco que bom senso, cuidado e uma dose de limites sempre será indispensável.

Como educadora prefiro utilizar todo campo de experiência como meio para aprendizagem, neste caso falo da minha observação sobre os games online e as relações sociais.

Quem aí tem filhos que joga com interação online?

Faz tempo que compartilho de experiências desta natureza com meus estudantes, agora chegou o momento em que também a maternidade me colocou frente ao desafio de ultrapassar as barreiras da “imigrante digital” que sou e participar da vida do meu “nativo digital”. Minha formação integral traz o conceito de que a base do sujeito resiliente é a estrutura de educação emocional que ele recebe e das suas vivencias sociais. 

Acontece que no mundo atual já não temos mais o papel de orientar as relações sociais que acontecem apenas fisicamente, elas também estão sendo conectadas pelo telefone, pelas mensagens e pelos contatos dos jogos online. Contatos esses que na maioria das vezes são desconhecidos.

Na amizade online parece não haver regras que na vida presencial reforçamos que existam. 

Percebam o seguinte relato: 

“Não está fácil para ninguém, e os desafios só aumentam! A brincadeira da vez aqui em casa é jogo online. O guri foi aos poucos (mais rápido do eu desejava) e descobriu amizades desconhecidas para jogar. Acontece que nos preocupamos com os crimes possíveis contra crianças, tem um campo muito maior: as relações. 

 
Foi aí que ele entra chorando no quarto:
 
– Eu nunca mais irei jogar! Juro que não eliminei o jogador do meu colega, mas todos eles ficaram dizendo que fui eu; se uniram para me eliminar. Isso não é justo! Não se trata uma pessoa assim, eles nem me escutaram…
Em sua fala e muito choro veio todas as noções de respeito, injustiça, empatia, solidariedade que ensinamos; mas parece que tudo deixou de valer porque essa briga não permite uma resolução de conflitos ou mediação entre pares. “Ele nem ao menos conhece as pessoas que o magoaram, são representados por avatares.”

 

As relações em redes não seguem as mesmas regras sociais da convivência física. As ferramentas de conversas, expressão de sentimentos, pedido de desculpas, reconhecimento de falhas, pouco fazem sentido naquele ambiente. Lá boa parte dos “colegas” são cruéis e não cabe retomada de problemas.
 
Então aceitamos o errado como certo e permitimos que nossa essência se perca? Não
 
Proibimos o uso? Não
 
Neste mundo também vale a velha orientação para tudo que envolve a educação, a participação atenta e constante dos pais e cuidadores. Encontramos o campo de aprendizagem, é hora de aprender a lidar com as mídias sociais. Uma boa experiência de autodefesa na segurança da sua casa, com os adultos cuidadores apoiando e orientando.
 
Algumas dicas para garantir uma interação saudável:
 
  • Definir com a criança e adolescente o tempo de jogo, deixando espaço para brincar na natureza, fazer atividade física, tarefas escolares e até o simples ócio, tão importantes para criatividade.
  • Na hora das refeições e perto da hora de dormir os eletrônicos precisam sair de cena para adultos e crianças. O exemplo é mais eficiente que qualquer regra!
  • Evitar o uso de fones, especialmente quando a criança assiste vídeos, assim os adultos podem estar atentos as falas e propor reflexão de mensagens não adequadas.
  • Os momentos com eletrônicos devem ser em ambientes abertos, nada de quarto fechado. A interação dos adultos na observação dos jogos, orientação de atitudes e cuidado com as interações online são indispensáveis.
  • Saber o que as crianças e adolescentes jogam e com quem, qual a dinâmica e objetivos do jogo?
  • Conversar com as crianças e os adolescentes sobre tais objetivos que o jogo propõe e perceber se o jogador compreende a ficção proposta pelo jogo. Afinal não podemos sair destruindo estruturas ou matando pessoas por aí, não é mesmo?
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  • Observar as interações online e manter diálogo com as crianças e os adolescentes sobre como essas interações estão acontecendo.
Na aprendizagem, novos elementos sempre serão bem vindos para proporcionar os desafios necessários no crescimento de todos os envolvidos, e para isso é preciso muita observação, assim as oportunidades de transformação não serão desperdiçadas.
 
Gostou do conteúdo e quer aprofundar? Sugiro os livros Crescer na Era das Mídias Sociais, de David Buckingham; 

Por Simone Marcelino Bergental

Pedagoga com ênfase em Educação Infantil | Pós-graduanda em Gestão e Psicologia Escolar | Pós-graduanda em Supervisão Escolar

Coordenadora Escolar | Hub Três Figueiras | Porto Alegre - RS

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